quarta-feira, 30 de março de 2011

Sobre Príncipes e Plebeus

Tudo começou numa conversa com uma amiga. A primeira informação dela foi: "Estou meio assim". Eu quis saber o que era esse "meio assim" e ela me contou que estava se sentindo um pouco estranha com o relacionamento amoroso dela. É uma relação de pouco tempo, começou quente e carinhosa, mas, nos últimos dias, ele tinha ficado um pouco distante. Tentei reanimá-la e, principalmente, mostrá-la que temos a tendência de pensar sempre na pior coisa. Se ele está distante, deve estar desinteressado. Colocando no calendário, ele estava namorado-perfeito até sábado, mas na terça já havia se transformado em namorado-desinteressado. Por que já pensar no pior? Será que ele está atolado de trabalho? Será que alguma coisa aconteceu e, como o namoro ainda é recente, ele não se sentiu confortável em sair falando? Muitas coisas podem estar acontecendo e, até, ele pode ter se desinteressado pelo relacionamento. Até, mas não só. E foi nesse momento que ela me deu uma informação fundamental: "ele é um príncipe e eu sou uma plebéia". Xiiiii...

Vou dizer uma coisa para vocês: príncipes e princesas são chatos. São perfeitamente chatos. Não erram, sabem tudo, são fortes, são exemplos. Acho até que não fazem cocô. Não é possível fazerem isso sendo tão perfeitos. Eu sei do que estou falando, já tentei ser príncipe. Não é bom e é muito falso. Ninguém é perfeito, mas você acaba projetando a expectativa de que é. Aí, quando um príncipe erra (e vai errar, não tem jeito), vira sapo imediatamente. Não tente ser perfeito para agradar alguém. Você vai agradar verdadeiramente pelo que você é. Se não for assim, o relacionamento não valerá à pena e acabará da pior maneira.

Plebeus também são chatos. Se acham menores por qualquer coisa. Acham que não são merecedores daquela bênção que é o (suposto) nobre companheiro. Se inferiorizam por qualquer coisa. Eu sei do que estou falando, já fui plebeu. Essa minha amiga, por exemplo, é linda, charmosa, inteligente, engraçado, elegante, simpática e ainda cozinha maravilhosamente bem. Tem cultura e um bom gosto incrível. O que falta nela? Auto-estima. "Ele tem muito dinheiro e eu me viro para chegar ao final do mês", ela me diz. Desculpa esfarrapada. Ela tem medo de não ser a mulher da vida dele e, por isso, já se coloca em condição inferior. Usa qualquer argumento para justificar um possível fracasso da relação. E ainda se preocupa em achar que ele está desinteressado. Ninguém é plebeu. Todo mundo tem o seu lado nobre. E se não formos a melhor opção para nós mesmos, não seremos para mais ninguém. Não haverá parceiro que vá nos aturar. Quando olho para ela, vejo uma mulher desejada. Quando ela se olha nos espelho, vê uma mulher que não sente confiança em ser desejada. Se for, é uma bênção. Amiga, você pode ser uma bênção na vida de qualquer homem, mas precisa ser uma bênção para você mesma. Desse seu jeitinho, com todas as qualidades e defeitos que você tem.

Conversando com uma outra amiga (essa, o maior exemplo de auto-estima e segurança que eu conheço), ela me contou a história de um ex-namorado que abalava a sua segurança. Ela se sentia feliz na presença dele, mas porque ele era o gerador dessa felicidade. Era uma depedente. Ela se deu conta disso e chutou o cara para lá. Deixou bem claro que nunca mais queria vê-lo e foi ser feliz. Feliz com ela. Tempos depois, encontrou o homem que hoje é o seu marido. Já estão casados há muitos anos. Por que ele é o cara? "Porque me faz feliz", ela diz. Mas qual é a diferença para o outro? "Ele me faz feliz só de estar ao meu lado. Me faz feliz até no silêncio. Sou feliz por estar com ele, não porque ele é o motivo da felicidade para mim. Eu sou esse motivo. Erramos muito um com o outro, mas corrigimos os nossos erros. Queremos corrigir. Não só pelo outro, mas por nós. Sou feliz porque quando penso em alguém, penso em mim e nele, e não só nele. Penso no que ele faz por mim, para mim, comigo, conosco. Somos cúmplices na felicidade."


E eu espero que a minha primeira amiga, aprenda com as palavras da minha segunda amiga. Que ela seja feliz com ela e, com isso, com o seu parceiro. Que ela aprenda a ser cúmplice na felicidade. E não desejo isso só a ela, mas a todos. A mim e a todos vocês. Que sejamos cúmplices na felicidade e vivamos felizes para sempre.

segunda-feira, 28 de março de 2011

Mulheres Cotidianas 1

Objeto da Travessa

Ela entrou pela Livraria da Travessa da Sete de Setembro e parecia que a luz havia sido planejada para aquele momento. O fundo mais claro deu destaque à sua silhueta perfeita. Entre o térreo e o subsolo, ela escolheu o subsolo que, para minha felicidade, era onde eu me encontrava. Que mulher! Linda, elegante, cabelos pretos lisos e um pouco abaixo dos ombros, pele ligeiramente morena, olhos vivos, nariz levemente arrebitado e boca no tamanho certo. Nem grande, nem pequena, com lábios carnudos sem exagero. Um pescoço de Audrey Hepburn e, daí para baixo, um furacão com equilíbrio. Seios médios, cintura fina e quadris proporcionais. Tudo isso ressaltado no vestido preto, com cintura marcada, pala com bolinhas brancas e indo pouco acima dos joelhos. De maneira elegante, deixava perceber as pernas lindas, torneadas, bem cuidadas. Benditas coxas e panturrilhas.

Entrou e começou a circular pela loja, olhando para os livros expostos ali. Tudo nela era charmoso. O caminhar, o olhar, o pegar, cada movimento. Seus braços lembravam os de uma bailarina, com leveza e beleza na ação. Ela se interessou por um livro de Arte Moderna, com A Dança, de Matisse, na capa. Os movimentos dos braços das dançarinas lembravam os dos seus e o contraste do colorido da obra com o preto e branco da sua roupa fazia tudo ficar muito interessante. A cena era uma redundância, um trocadilho por si só: uma obra de arte circulando pela seção de arte. E eu sem conseguir tirar os olhos dela.

E ela procura, avalia, mexe e remexe. E eu observando. E ela começa a ver os livros de design, os de fotografia, e mexe os cabelos, ajeita a postura, se abana para afastar o calor de quem veio da rua. E eu admirando. E ela se entretem com os livros de viagem, olhando as fotos com atenção. Um ligeiro sorriso é dado e, num toque de simplicidade e sensualidade, ela tira um dos pés de dentro do sapato e coça levemente o tornozelo da outra perna. O pé arqueado acariciando a sua pele, forçando a contração da panturrilha, fazendo a saia subir um pouco e revelar mais a sua coxa. Sem perder o equilíbrio, a elegância, o charme. E eu adorando.

Já não sei mais o que havia vindo procurar na livraria, mas procurei me comportar como se estivesse interessado em algum livro. Fiquei um pouco assustado com o poder que aquela mulher tinha de me tirar do ar. Fiquei até um pouco decepcionado comigo, pois olhava para ela como um objeto de admiração. Um objeto. Que feio isso! Em pleno século XXI, olhar para uma mulher como se ela fosse simplesmente um objeto, somente pela sua estética. E a pessoa por trás dessa beleza? E a sua história? E comecei a imaginar quem ela seria, a criar uma história para ela. Mas não conseguia ficar muito tempo nisso. Linda, ela acabava atraindo o meu olhar e meus pensamentos. Tentei controlar essa ação instintiva, mas não consegui. Ela era um objeto de desejo para mim. Me culpava por esse pensamento, mas não deixava de tê-lo. Era mais forte do que eu.

E ela circulava e não se decidia por nada. E eu olhava. E ela mexia em todas as pilhas de livros. E eu olhava. E ela passou bem perto de mim. Parou ao meu e disse:

- Adorei o modo como você me olha. Se não tivesse que voltar para o trabalho, ficaria horas desfilando na loja para você me olhar desse jeito.

Disse isso e foi embora. Eu fiquei parado, supreendido pelo o que ela havia dito. Não estava preparado para isso. Acho que não estava preparado para, sequer, falar com ela. e eu nem falei, foi ela quem falou. Eu havia sido tão objeto para ela quanto ela havia sido para mim. Sorri e voltei para o trabalho.